Ações da Ultrapar (Painel do Paim) - N. 020 da série de 599 Blogs do Coronel Paim - O Porta-Voz

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Reincidência é menor nos EUA com tratamento a viciado em vez de prisão (Postado por Lucas Pinheiro)

A experiência dos Estados Unidos com os tribunais de drogas, programas de reabilitação para acusados de pequenos delitos relacionados ao uso de substâncias ilegais, tem servido de exemplo para a aplicação de projetos similares no Brasil.

É para isso que a especialista Tara Kunkel chegou nesta quinta-feira (17) a São Paulo. Por mais de 10 anos, ela comandou um tribunal de drogas no estado da Virgínia, depois de ajudar a escrever a legislação do estado sobre eles e fundar a primeira organização sem fins lucrativos para apoiá-los. Ela participa nesta quinta de um seminário em São Paulo sobre o assunto.

Hoje à frente do Centro Nacional de Tribunais Estaduais dos EUA, Kunkel explicou em entrevista ao G1 como o sistema funciona nos Estados Unidos.

"São dois os objetivos principais dos tribunais de droga: um é ajudar a pessoa a superar o vício através de tratamento e supervisão, e o segundo é parar o ciclo em que essas pessoas entram de voltar ao Sistema Judiciário por conta de novos crimes. E esses dois andam de mãos dadas", afirma.

Existem hoje nos Estados Unidos mais de 2.500 tribunais de drogas e, segundo a especialista, oito em cada dez dependentes que participam de um programa de reabilitação conseguem se livrar das drogas. E estudos mostram que, a cada dólar gasto no tratamento, o governo americano economiza US$ 3 com prisões.

Como funciona
Para esclarecer como funcionam os tribunais nos EUA, a especialista usou como exemplo o caso de uma mulher de 35 anos que já tinha sido presa diversas vezes por queixas ligadas a drogas, era viciada em crack havia 15 anos, tinha perdido os dois filhos por dificuldade em criá-los e passou a se prostituir.

Um acordo foi feito na corte, e ela aceitou participar do tratamento por um período de 18 meses, além de se submeter a exames para verificar seu progresso. "Durante esse período, ela conseguiu um emprego pela primeira vez na vida, recuperou a guarda dos filhos, ficou todos os 18 meses sem consumir drogas e hoje tem sua própria casa. Ela já está livre do vício há 5 anos."

"Há uma equipe que trabalha em cada caso ao longo de todo o período: oficiais de Justiça, médico, policiais e o juíz. Eles revisam o progresso a cada semana ou a cada 15 dias", conta.

"Ao final, a maioria dos tribunais nos EUA opta por retirar as queixas contra o acusado no caso de o programa ser completado com sucesso. No caso dessa mulher, as duas queixas que teriam a levado à cadeia foram retiradas. Isso serve como uma grande motivação para essas pessoas", completa.

Reincidência
Segundo Kunkel, o índice de pessoas que segue sem voltar à criminalidade é menor que o de pessoas que apenas se livram do vício, mas isso demonstra que há progresso.

"Vemos que, nos Estados Unidos, a ação dos tribunais de drogas diminui a reincidência criminal em um índice entre 18% e 26%, comparado com o das pessoas que não passam pelo programa. E em grande parte isso ocorre porque aquele vício está sendo tratado pela primeira vez", afirma.

O conceito foi criado em 1989 nos EUA. Em vez de cumprir pena na prisão, os acusados por pequenos delitos participam de programas de reabilitação (reuniões de grupo e prestação de serviços à comunidade), que têm por objetivo tratá-los da dependência química e reintegrá-los à sociedade.

Segundo Kunkel, o acompanhamento dos pacientes revelou também que houve melhoria significativa em outras áreas da vida dos participantes, tais como frequência e rendimento escolar (no caso de adolescentes), adesão a atividades profissionalizantes, reorganização da vida, convívio familiar e percepção sobre o uso de drogas.

Modelo brasileiro
No Brasil, o modelo ainda é relativamente novo, e o termo usado tem sido justiça terapêutica. Mas experiências similares já são adotadas por 20 estados brasileiros e o governo federal vem discutindo mudanças na lei nacional antidrogas para poder incorporá-lo.

Responsável por um dos exemplos de programa de justiça terapêutica, Paulo Sérgio Sobrinho, promotor de Justiça Criminal do Fórum de Santana, em São Paulo, afirma que falta uma estrutura mínima para que o sistema funcione com mais eficácia no Brasil.


"Creio que se houvesse a aplicação de recursos mínimos para articular mais esse tipo de atendimento, ele teria mais resultados. Muitas vezes, a pessoa não tem condições de chegar ao local e passa a faltar. Se houvesse como auxiliar essa pessoa de forma regular, isso seria uma grande ajuda. Também falta mais treinamento para os funcionários do Judiciário e do Ministério Público", aponta o promotor.

Ele elogia a maneira como o auxílio é dado nos EUA, com a noção de time ou equipe acompanhando o caso. "A corte de drogas [nos EUA] não existe só em função do juiz ou do promotor. Ela tem uma estrutura enxuta que permite que o juíz continue trabalhando nos demais casos sem ter que parar, por conta da estrutura de apoio", o que não ocorre no Brasil.

"Hoje nós fazemos algo parecido em Santana com o apoio dos promotores, funcionários, organizações (como Alcoólicos Anônimos, Narcóticos Anônimos etc.), e muita vontade. Faltam verbas e meios para levar melhores condições às pessoas que precisam ser tratadas", afirma Mário Sérgio.

Seminário
O seminário “Tribunais americanos de droga – a saúde pública e a justiça terapêutica”, promovido pela Escola Superior do Ministério Público (ESMP), com o apoio do Consulado dos Estados Unidos em São Paulo, será às 18h na sede do Ministério Público de São Paulo (Rua Riachuelo, nº 115, Centro). O evento terá transmissão ao vivo pelo site da ESMP (www.apmp.com.br).